Muitos de nós não damos o real valor para a grandeza deste homem que foi São João Batista. Não é à toa que os evangelistas dedicam uma parte importante dos seus escritos para tratar da figura e da mensagem deste grande profeta.
Aliás, basta vermos o elogio feito pelo próprio Cristo a este seu primo querido: “Em verdade vos digo: entre os filhos das mulheres, não surgiu outro maior que João Batista” (Mt 11,11). Logo em seguida, nosso Senhor o compara ao profeta Elias (versículo 14).
Seria possível meditar diversos aspectos da vida do Batista: o seu nascimento milagroso; a sua vida dedicada à penitência; a justiça dos seus discursos; ou mesmo a maneira humilde como se portou diante do Messias, de quem chegou a afirmar que não seria digno de desamarrar as sandálias. Mas, de todos os aspectos possíveis, este pequeno texto pretende meditar brevemente sobre apenas um: a morte de São João.
O CONTEXTO DO MARTÍRIO
Muitos já conhecem o relato da morte de João Batista, resumido por São Marcos em seu evangelho (capítulo 6, versículos de 14 a 29). O responsável pelo martírio foi o rei Herodes Antipas, filho daquele velho Herodes que recebeu os Reis Magos e determinou a morte das crianças inocentes.
Acontece que Herodes Antipas era governador da Judeia, justamente a região em que São João pregava e realizava os batismos de conversão. Naquela época, Herodes “se casou” com uma mulher perversa de nome Herodíades. Mas havia um problema: Herodíades já era casada com Filipe, o irmão do próprio Herodes.
É evidente que aquela união do governante era ilícita e, inclusive, bastante escandalosa. E é muito provável que as pessoas tenham se dirigido a João Batista para saber o que pensar a respeito daquilo. É justamente aqui que João precisou tomar uma decisão importante: ele precisaria escolher entre aquilo que era fácil e aquilo que era certo.
João poderia simplesmente ter ignorado aquele escândalo e se concentrado em seus próprios assuntos. Este seria o caminho fácil. Aliás, poderia até mesmo ter caído nas graças do rei e adquirido alguma posição importante na Judeia, tornando-se poderoso e rico. O próprio Evangelho menciona que Herodes gostava de ouvir os discursos de João Batista.
No entanto, a Palavra de Deus ensina que “importa obedecer antes a Deus do que aos homens” (At 5,29). João era um homem santo e, portanto, não deixaria de fazer o certo somente para optar pelo que é mais fácil. Era a salvação das pessoas que estava em risco com aquele escândalo! Os mandamentos de Deus precisavam ser lembrados ao povo, ainda que isso custasse a prisão e o sangue do profeta.
São João denunciou publicamente o pecado do governante, o que lhe valeu realmente a prisão. Posteriormente, a perversa Herodíades conseguiu manipular o fraco “marido” e João Batista acabou por ter a cabeça decepada na prisão. Mas aquilo que parece ser um fim trágico e decepcionante é, na verdade, a maior de todas as glórias de João Batista: o martírio e a coroa do Céu!
E QUANTO A NÓS?
O martírio de São João Batista não é apenas uma “historinha bonita” repetida há séculos, como os contos de fadas ou os mitos culturais. Trata-se de um modelo a ser seguido, independentemente da época e do contexto social.
O fato é que, ainda nos dias de hoje – e talvez mais do que nunca! –, continuamos diante de situações nas quais precisamos escolher entre aquilo que é fácil e aquilo que é certo. Pode ser que os “Herodes” de hoje tenham outros nomes e outros rostos, mas eles continuam exigindo de nós uma resposta condizente com as nossas crenças mais profundas.
Não estou dizendo que precisamos subir em todos os púlpitos e apontar o dedo para as pessoas ao redor, lançando na face de cada um os pecados alheios. Não é esse o tipo de profetismo que o Senhor espera de nós.
No entanto, se sou verdadeiramente um cristão, preciso tomar a consciência de que as minhas palavras, gestos e escolhas devem refletir integralmente a minha fé – ainda que isso desagrade os outros e coloque em risco a minha “reputação”.
Criou-se um mito lamentável de que nós só precisamos ser católicos durante a Missa do domingo, e que a religião não deve interferir nas nossas escolhas políticas ou nas nossas opiniões. Que grande engano! Deus não nos chama a sermos católicos pela metade. É absolutamente falso que nós precisamos viver duas vidas, uma para Deus e outra para o politicamente correto.
O PREÇO DA GLÓRIA É A LUTA PELA VERDADE
É possível que no futuro você venha a sofrer terríveis consequências se mantiver a sua postura contrária ao aborto. É possível que venha a perder o emprego se não aderir às tendências paganizantes do mundo moderno. Quem sabe até mesmo não venha a perder benefícios ou a própria liberdade caso insista em se manter verdadeiramente católico…
Mas é aqui que precisamos nos lembrar do velho exemplo de João Batista, ele bem sabia dos riscos que corria ao pregar a verdade, sabia que não seria fácil e que precisaria ter coragem para pagar o preço da glória.
Nosso Senhor, lembrando-se de São João, disse essa frase excepcional: “Desde a época de João Batista até o presente, o Reino dos Céus é arrebatado à força e são os violentos que o conquistam” (Mt 11,12).
Preste bem a atenção nisso: o Reino dos Céus é conquistado por aqueles que se esforçam, por aqueles que fazem violência contra as facilidades que o mundo oferece. Em outras palavras, Deus espera de nós que vivamos de acordo com a Verdade e, se necessário, paguemos o preço por ela. “Esforça-vos para entrar pela porta estreita”, nos lembra Jesus.
Que Deus nos dê a coragem e a fidelidade do grande São João Batista, a fim de que saibamos trocar as futilidades do tempo presente pelo verdadeiro tesouro da vida eterna!
Rafael Libório
Consagrado da Comunidade Católica Pantokrator