“O sacerdócio é o amor do coração de Jesus”

“Liberté, Egalité, Fraternité” (Liberdade, Igualdade e Fraternidade). A “descoberta” e “libertação” da razão. Homem sem Deus. Não estou falando de hoje, não. Estamos na França, no fim do século XVIII. No meio de toda essa “Babel”, em que o homem se rebela contra si mesmo, tentando retirar de si o seu coração, a sua vida: DEUS; em meio a uma crise política, em que se ergue um novo momento na História da Humanidade, em meio a tanto tumulto, nasce, num lugarejo (Dardilly) perto de Lyon, aos 8 de maio de 1786, João Maria Vianney. Um menino simples, pobre, mas com um coração sedento de amor por Aquele que muitos esqueceram. A situação não era das mais fáceis.

A Missa da qual esse menino participava era às escondidas, pois os sacerdotes que se negavam a assinar um acordo com o Regime eram perseguidos e, se encontrados, decapitados. Pela Divina Providência, tudo isso inflamava o coração de João para o sacerdócio.
Mas, se o desejo era grande, sua instrução era muito precária. Aprendeu a ler aos 8 anos. Aos 19, vai para Ecully ter aulas com um sacerdote. Mas seu pouco conhecimento – quase um analfabeto – somando-se às constantes dificuldades de se lembrar das matérias estudadas, as baixas notas e, quase entrando em desespero por não aprender o que lhe era ensinado, intensifica suas orações até o esgotamento de seu coração. De tantas tentativas, vendo a falta de vocações, o desejo do seminarista e, pela Divina Providência, por insistência de Pe Balley, o Cardeal Fesh resolve ordenar-lhe sacerdote.

Cura de Ars

“(Meu Deus), concedei-me a conversão da minha paróquia; aceito sofrer tudo aquilo que quiserdes por todo o tempo da minha vida!” (1). Foi com essa oração que começou sua missão. Na era da Razão, do “penso, logo existo”, um sacerdote que nem mesmo podia confessar seus paroquianos enquanto não terminasse o curso de Moral, mostra, pelo “rezo, logo existo”, um caminho de felicidade. Ars é um vilarejo esquecido do mundo. Tem uma população de aproximadamente 200 pessoas, vários botequins, mentiras e falsidades nas negociações. Reinam as danças (2), o “ficar” (com outro nome à época), os roubos (desde pequenas frutas das árvores até mesmo na demarcação da terra), as bebedeiras, enfim. Pouco povo, muitos problemas. Mas o santo olha para a Cruz como caminho para a ressurreição, não é mesmo? Sim. E assim fez o Cura. Cura significa pároco, em francês. Com uma pregação simples, mas cheia de amor pela conversão de seu povo, Pe. João vai convertendo sua aldeia. Com penitências, jejuns e muita oração, vai adquirindo pela obra do Espírito Santo em sua pobre alma o conhecimento que tanto lhe faltara e a força para empreitar sua missão. É obstinado pela conversão dos seus e, quando começa confessar, não tarda em atendê-los: pela meia-noite começa a confissão das mulheres, logo após a dos homens. Missa, Liturgia das Horas, Providência (Instituto de Caridade que fundou para abrigar crianças carentes), mais atendimentos e aconselhamentos, serviços paroquiais preenchem sua agenda diária, que termina por volta das 22 horas, quando não lhe vem alguém pedir algum conselho ou ouvir a confissão. Ah, lógico, café e almoço “fartos”: meio copo de leite e umas batatas, respectivamente (ascese para conversão de sua paróquia). Detestado pelo clero de sua diocese, por seus irmãos de vocação, devido a sua simplicidade no vestir e no falar, consegue aumentar o ciúme quando toda a região busca seus conselhos. Até mesmo de Paris iam peregrinos para confessar e ouvir seus magníficos conselhos! Deus Se esconde dos “sábios” e se revela nos pequenos (3), porque eles se deixam ser tocados pelo Pai. Eis a diferença. João Maria se deixou, em sua pequenez e pobreza, que Deus o preenchesse. Por isso toda a França – toda a Europa! – ia atrás dele. Afinal, ele mesmo dizia: “Um bom pastor, um pastor segundo o coração de Deus é o maior tesouro que o bom Deus pode conceder a uma paróquia e um dos dons mais preciosos da misericórdia divina” (4).
É impossível, nos limites de um artigo, abranger toda a vida apostólica do Cura d’Ars. Tornou seu confessionário odioso ao diabo, porta do céu e salvação das almas. Gastou sua vida pelos seus paroquianos. Gota por gota de sua vida. Travou luta contra a ação do Maligno, retirou das garras da morte seus paroquianos e todos aqueles a quem Deus lhe encaminhava. Não teve medo de assumir sua missão de pastor. Pe Vianney faleceu em profundo odor de santidade, sem mais forças, no dia 29 de julho de 1859. Tanto odor de santidade, que seu corpo está incorrupto. Em 1924, Pio XI canoniza o menor de todos os párocos, na presença de inúmeros bispos e cardeais.

Fidelidade de Cristo, fidelidade do sacerdote

“Oh como é grande o padre! (…) Se lhe fosse dado compreender-se a si mesmo, morreria. (…) Deus obedece-lhe: ele pronuncia duas palavras e, à sua voz, Nosso Senhor desce do céu e encerra-se numa pequena hóstia”. É nessa magnanimidade da missão que Bento XVI anuncia o Ano Sacerdotal, tendo como tema: “Fidelidade de Cristo, fidelidade do sacerdote”; e como modelo, o Cura d’Ars. Ora, em meio a tanta tribulação, difamação e calúnia, o Santo Padre propõe um grande clamor pelos sacerdotes, pelos filhos prediletos de Nossa Senhora, por aqueles que “mandam” em Deus para que Ele venha no pão e no vinho. Sublime vocação necessita de muita oração. Por isso esse Ano Jubilar. O Papa conclama que se levante uma legião de santos e ousados sacerdotes, que revelem pela vida o Cristo Pastor e Mestre. Que lutem por suas ovelhas. Que estejam em comunhão com o Bispo e nesse corpo místico levem a santidade ao mundo. E para chegar ao objetivo do Papa, que ele havia dito à Sagrada Congregação para o Clero – “ajudar a perceber cada vez mais a importância do papel e da missão do sacerdote na Igreja e na sociedade contemporânea” – várias reuniões acontecerão; está previsto para esse Ano Jubilar um “Diretório para os Confessores e Diretores Espirituais”, assim como uma “recopilação de textos do Papa sobre os temas essenciais da vida e da missão sacerdotais na época atual”.
A CNBB tem previstos vários eventos para esse Ano, como por exemplo, momentos de lazer entre os padres para aprofundar laços de amizade; atividades que unam Bispo, presbíteros, seus familiares; formação permanente aos padres, entre outras atividades.
Rezemos por nossos sacerdotes e os ajudemos no seu caminho de santidade, apoiando-os em seu mistério. Trago aqui a oração com que Bento XVI encerra sua Carta e uma frase do Cura sobre os sacerdotes: “À Virgem Santíssima entrego este Ano Sacerdotal, pedindo-Lhe para suscitar no ânimo de cada presbítero um generoso relançamento daqueles ideais de total doação a Cristo e à Igreja que inspiraram o pensamento e a ação do Santo Cura d’Ars. Com a sua fervorosa vida de oração e o seu amor apaixonado a Jesus Crucificado, João Maria Vianney alimentou a sua cotidiana doação sem reservas a Deus e à Igreja. Possa o seu exemplo suscitar nos sacerdotes aquele testemunho de unidade com o Bispo, entre eles próprios e com os leigos, que é tão necessário hoje, como o foi sempre (…). ‘Sem o padre, a morte e a paixão de Nosso Senhor não teria servido para nada. É o padre que continua a obra da Redenção sobre a terra. O padre possui a chave dos tesouros celestes: é ele que abre a porta; é o ecônomo do bom Deus; o administrador dos seus bens. O padre não é padre para si mesmo, é-o para vós’”(5).

Mais informações sobre o Ano Sacerdotal:
www.annussacerdotalis.org e www.cnbb.org.br

(1) H. GHEON, “O Cura d’Ars” , Ed.Quadrante.
(2) Que equivalem nos dias de hoje às boates.
(3) Cf Lc 10,21.
(4) H. GHEON, “O Cura d’Ars”, Ed.Quadrante.
(5) BENTO XVI, “Carta aos sacerdotes para o Ano Sacerdotal”, 2009.

Leonardo Pataro
Discípulo na Comunidade Católica Pantokrator

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