A vontade de Deus não cansa, mas descansa!
Começo esse texto com essa verdade, de modo imperativo. Inclusive poderia terminar por aqui. A vontade de Deus descansa nossa alma. Vamos conversar sobre isso.
Quantas vezes você, assim como eu, teve a experiência de um dia de folga ou de férias dormir até mais tarde e acordar “arrebentado”, pior do que quando foi dormir. Em contrapartida, depois de um longo e satisfatório trabalho, ou depois de uma agradável visita, ir embora de casa muito tarde, ter dormido pouquíssimas horas e ter levantado disposto e animado?
Na correria da vida, vamos nos cansando: deslocamento ao trabalho, situações difíceis, boletos que se multiplicam, filhos que adoecem, enfim. Quando tudo parece melhorar, outra situação difícil. E quando parece que vemos uma “luz no fim do túnel”, vem “um trem“…
Cansamos! Cansamos das situações, cansamos dos problemas, cansamos de estar cansados!
Cansamos de nós mesmos; cansamos de Deus.
Veja, as situações não são fáceis e, diante disso, te pergunto: o que te cansa hoje? (Este texto? Pode ser! Quanto cansaço descrevo!) O que te faz perder o ânimo, a esperança?
Jesus em Mateus 11, 29 diz assim: “Tomai meu jugo sobre vós e recebei minha doutrina, porque eu sou manso e humilde de coração e achareis o repouso para as vossas almas”
Temos nossos sonhos, ideias, metas etc. E por vezes, muitas vezes, não perguntamos a Deus qual a vontade d’Ele? Veja, não é pura e simplesmente um aniquilar da nossa vontade. Santa Teresinha diz em ‘História de uma alma’ que “Deus não poderia inspirar em mim desejos irrealizáveis”. Mas esses desejos, esses sonhos, são a santidade. E a santidade que Deus quer, não a que eu acho que devo ter.
Por vezes, almejo a minha alma uma santidade que nunca terei. E aqui não “baixo a régua”, a medida. Por vezes, queremos um martírio que não estamos dispostos a assumir, uma vida de oração que não temos capacidade de assumir. Enfim, desejamos situações para a nossa alma, como as dietas que sempre deixamos para começar na segunda, mas na próxima, pois nessa não dá, não quero.
Projetamos em nossa vida situações, vocações (sonhamos com o vestido, nome dos filhos, etc. Ou que paróquia assumiremos, o que faremos nas pastorais, nome de quando for papa, etc.), mas não perguntamos a Deus se essa é a Sua Vontade e essa inspiração é Divina.
Santa Teresa D’Ávila dizia que, se estivesse diante da hóstia consagrada e Jesus aparecesse a ela, confiaria mais na hóstia do que na aparição, pois sabia que o demônio poderia tirar a atenção daquilo que era real.
Buscamos carreiras, bens materiais, vida de santidade, mas conflitamos com o sonho de Deus. Esse sonho sempre é realizável e Ele inspira nosso coração a buscar. Mas não nos cansa.
Pode te deixar cansaço fisicamente, mas não mental, psicológica ou espiritualmente. A vontade de Deus é regente e sustento de nossa vida.
O amor não cansa nem se cansa (São João da Cruz)
A vontade de Deus é puro amor. E o amor não nos cansa e nem se cansa. Voltemos ao Evangelho: Jesus diz que o jugo d’Ele é suave. Veja, Jesus tem um jugo, tem um peso.
A vontade de Deus, o caminho de santidade, o desafio de ser sal e luz no mundo é um fardo. Tem um custo a nós. Fazer o que Deus quer, por vezes, requer a morte de nossa vontade, de nosso tempo, de nossos sonhos.
Pode ser que seja aquilo que você sempre sonhou. Meu caso: sempre quis ser consagrado a Deus. Hoje o sou. Portanto, se as ‘vontades’ foram conciliantes, quer dizer que não há sofrimento? Não! Pelo contrário.
Por vezes achamos que dar a vida a Deus é pregar, cantar, dançar, conversar com os jovens, rezar… E sim, isso é dar a vida a Deus. Mas quando somos chamados a lavar o banheiro, pedir doação, vender bolo no fim da missa, não fazer algo de errado no trabalho, daí a vontade de Deus já não é tão legal, já “cansa a beleza”.
Lembro que meu primeiro trabalho após minha Promessa Temporária na Vocação foi limpar a caixa de gordura. Pensei: me consagrei a Deus para isso? Sim! Para isso e para tudo o que Ele pedir. Quem viu? Ninguém. E assim será nossa vida. Durante 30 anos a vida de Jesus foi simples e oculta. Ele ia à sinagoga, as pessoas o conheciam, compravam em sua marcenaria. Ainda não conheciam o JESUS, O pregador, O milagreiro, O Salvador.
Santa Bakhita era porteira de seu convento, Santa Teresinha era a pequena no Carmelo, São João Paulo II foi papa, Santa Joana d’Arc foi guerreira, enfim, Deus dá a cada um o caminho de santidade que lhe é preferível e que aquela alma pode caminhar.
Aqui está a chave: sua alma.
VOCÊ pode caminhar a trilha que lhe é apresentada por Deus: penúria, riqueza, doença, tranquilidade, perda de ente querido, esse caminho é seu. E quando encontramos, entendemos e aceitamos, o fardo fica leve e o jugo, suave.
Daí não nos cansamos. Daí a vida fica leve. Não sem sofrimentos, não sem tormentas, não sem dificuldades, mas com um jugo leve e com um fardo suave.
Diante da realidade de nossa época, nos perdemos na frouxidão da tecnologia e da cultura hedonista que vivemos. Achamos que Deus retira os fardos e jugos, mas Ele mesmo nos dá um fardo e um jugo, mas que são possíveis e lidáveis.
Finalizando, perguntei no começo do texto: o que te cansa hoje? Isso, hoje pode ser a sua causa de santificação. Isso, hoje pode ser o confronto da tua vontade com a vontade de Deus. Cabe a nós rezar e pedir a Deus a graça, não de nos afastar, mas de saber como viver essas situações.
Oferecer o Santo Terço, a Santa Missa, jejuns e ascese para que nossa alma descanse na vontade – bondosa e fiel – de Deus.
“Que mais queres, ó alma, e que mais buscas fora de ti, se encontras em teu próprio ser a riqueza, a satisfação, a fartura e o reino, que é teu Amado a quem procuras e desejas?
Em teu recolhimento interior, regozija-te com ele, pois ele está muito perto de ti.
A alma que verdadeiramente ama a Deus não deixa de fazer o que pode para achar o Filho de Deus, seu Amado. Mesmo depois de haver empregado todos os esforços, não se contenta e julga não ter feito nada.
Ó Senhor, Deus meu! Quem te buscará com amor tão puro e singelo que deixe de te encontrar, conforme o desejo de sua vontade, se és tu o primeiro a mostrar-te e a sair ao encontro daqueles que te desejam?
O amor não cansa nem se cansa.
Onde não há amor, põe amor e colherás amor.
Para quem ama, a morte não pode ser amarga, pois nela se encontram todas as doçuras e alegrias do amor. Sua lembrança não é triste, mas traz alegria. Não apavora nem causa sofrimento, pois é o término de todas as dores e o início de todo bem” (O amor não cansa nem se cansa – São João da Cruz).
¹ Cultura hedonista busca o prazer acima e no fim de tudo. Assim como a busca do conforto como bem supremo. Não cabe a dor e sofrimento, mesmo aqueles inerentes à vida, como envelhecimento, dores comuns, doenças e a morte. Exemplo disso é a busca constante de analgésicos em dores pequenas e suportáveis, mas como não posso sentir dor, em qualquer situação, busco um analgésico. Ou mesmo na ausência de um carro, a pessoa se recusa a caminhar a um ponto de ônibus, pois lhe cansará, então nem sai de casa.
Leonardo Araújo Pataro
Consagrado da Comunidade Católica Pantokrator