Igreja: Corpo Místico de Cristo no mundo

Todo mundo já teve aquele amigo que tentou te convencer de que a Igreja e a religião eram desnecessárias para uma vida de fé, e que era possível seguir a Cristo apenas com o próprio coração. Ou ainda que estão convictos de que é suficiente concordar apenas com o que lhes é confortável nos assuntos da religião, aderindo-a de maneira superficial, seletiva e cômoda. Será que realmente basta amar a Cristo sem nunca aderir verdadeiramente ao cristianismo, mantendo-se sempre distante da Doutrina da Igreja? Seria isso sequer considerado amor, ao invés de uma mera conveniência?

A Igreja existe por uma razão, ainda que as pessoas dentro dela sejam pecadoras e, muitas vezes, irão nos decepcionar. Mas, aqui não estou falando da Igreja somente enquanto pessoas que frequentam uma comunidade ou paróquia e sim da Igreja como religião. Como doutrina, como instituição fundada pelo próprio Jesus Cristo (cf. Mt 16, 18) e que é essencial para uma vida de conversão autêntica e concreta. 

Tudo começa com o significado de ser cristão e com o significado de amor. Como é possível dizer que se ama a Jesus sem adesão completa ao seu Evangelho? Que tipo de amor é esse, que não se traduz no concreto de nossas vidas?  “De que adianta, irmãos, alguém dizer que tem fé, se não tiver obras? Acaso essa fé poderá salvá-lo?” (Tg 2, 14), nos ensina o apóstolo São Tiago.

O amor e a fé em Jesus sem conversão são completamente estéreis e mortos.

O cristianismo não é sobre ser uma boa pessoa. Isso não é nada além da obrigação de qualquer ser humano, não é mesmo? O cristianismo vai mais longe! Ser cristão é ser chamado a ser SANTO, seguindo os passos de um Cristo casto, pobre e obediente até a morte. É sobre conversão, sacrifício de cruz, morte para o pecado e ressurreição para uma vida nova. E sem a religião, sem a Igreja, sem a Santa Missa, sem os Sacramentos, a Doutrina, a comunidade… viver a conformação ao Cristo casto, pobre e obediente é uma missão praticamente impossível.

Há um ditado famoso na tradição da Igreja, citado muitas vezes por inúmeros santos, que diz: “Fora da Igreja não há salvação!”. Esta frase pode parecer escandalosa para muita gente, mas o próprio Senhor é insistente nessa ideia ao longo de toda sua vida pública: “Respondeu Jesus: ‘Em verdade, em verdade te digo: quem não renascer da água e do Espírito não poderá entrar no Reino de Deus.’” (Jo 3, 5); “E disse-lhes: “Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda criatura. Quem crer e for batizado será salvo, mas quem não crer será condenado” (Mc 16, 15:16). Nada disso significa que apenas os batizados católicos entrarão no Reino dos Céus, mas sim que todo aquele que é salvo é porque, de algum modo, foi alcançado pela Graça que jorra da Igreja. Mesmo pertencendo a outra religião. 

Isso se dá porque a Igreja é o Corpo Místico de Cristo no mundo hoje, tendo como missão e finalidade dar continuidade a ação de Cristo encarnado como homem. É isso que Jesus institui ao enviar seus apóstolos, e é isso que os apóstolos querem dizer quando pregam: “Ele é a Cabeça do Corpo, da Igreja” (Cl 1, 18); “Porque, como o corpo é um todo com muitos membros, e todos os membros do corpo, embora muitos, formam um só corpo, assim também é Cristo” (1Cor 12, 12); “Assim nós, embora sejamos muitos, formamos um só corpo em Cristo, e cada um de nós é membro um do outro” (Rom 12, 5). Além disso, quando o próprio Saulo perseguia os primeiros cristãos, antes de se converter, Jesus o confronta como se estivesse perseguindo a Ele mesmo: “Eu repliquei: Quem és tu, Senhor? A voz me disse: ‘Eu sou Jesus de Nazaré, a quem tu persegues’” (Atos 22, 8).

Papa Pio XII, em sua encíclica Mystici Corporis, explica: “Essas graças podia ele distribuí-las diretamente por si mesmo a todo o gênero humano. Quis, porém, comunicá-las por meio da Igreja visível, formada por homens, afim de que por meio dela todos fossem, em certo modo, seus colaboradores na distribuição dos divinos frutos da Redenção”. Essa colaboração se dá de inúmeras formas, sendo as principais delas guardando a Verdade e celebrando Sacramentos.

Doutrina: guardiã da Verdade

Imagine se cada um que decidisse “amar” a Cristo de forma independente, sem se vincular a religião, decidisse também interpretar o Evangelho da maneira como bem quer? A Verdade do Senhor já haveria se perdido ao longo da história, pois como seres marcados pela concupiscência do pecado se torna fácil distorcer o Evangelho de forma conveniente e confortável. 

A Igreja está a serviço da Verdade, se preocupa em proteger sua integridade. Mesmo sendo feita de homens de carne, ela é infalível para defender as questões de fé, pois assim prometeu Jesus a Pedro: “E as portas do inferno não prevalecerão sobre ela” (Mt 16, 18). Contamos com assistência vinda do Alto, pois o próprio Jesus enviou o seu Espírito para conduzir os homens em questões de Doutrina: “Quando vier o Paráclito, o Espírito da Verdade, ele vos ensinará toda a verdade, porque não falará por si mesmo, mas dirá o que ouvir, e vos anunciará as coisas que virão” (Jo 16, 12). De modo algum a Igreja tem poder de mudar aquilo que é a Verdade. Seu papel é conservar a Verdade já revelada na Palavra de Deus.

Muitos resumem, porém, a Palavra de Deus somente às Sagradas Escrituras, quando na realidade a Palavra de Deus é o próprio Verbo que se encarnou, ou seja, a pessoa de Jesus Cristo. Por mais que a Bíblia nos revele muitas coisas sobre a pessoa de Jesus, é impossível que contenha tudo. “Jesus fez muitas outras coisas. Se fossem escritas uma por uma, penso que nem o mundo inteiro poderia conter os livros que se deveriam escrever” (Jo 21, 25). Durante os primeiros anos depois de Cristo, as Sagradas Escrituras ainda nem existiam. Aliás, se não se acredita na infalibilidade da Igreja, não seria possível acreditar nem na infalibilidade da Bíblia, uma vez que a Bíblia nasce da Igreja e não o contrário! Tudo o que os apóstolos tinham antes disso era passado de boca a boca, e a isso damos o nome de Tradição.

A Tradição deixada pela Igreja Primitiva também faz parte da Revelação, e nela se encontra orações como o credo, a liturgia, os escritos de padres, os ritos, e muito mais. Sem a religião e sua doutrina, muito sobre a Tradição nos seria roubado no decorrer da história.

Sacramentos: poder de Cristo na vida dos homens

Instituídos pelo próprio Jesus ao longo de sua vida pública, os sacramentos são formas de Cristo agir na vida dos homens de hoje através da Igreja como seu Corpo Místico. Nos sacramentos, o Espírito Santo age com a mesma graça e poder com que Jesus agia na vida das pessoas ao longo do Evangelho, sendo essenciais para a salvação dos homens. “Que os homens nos considerem, pois, como simples operários de Cristo e administradores dos mistérios de Deus” (1Cor 4, 1).

Desse modo, o Catecismo da Igreja nos ensina que os sacramentos “São eficazes porque neles age o próprio Cristo; é ele quem batiza, é ele quem atua em seus sacramentos, a fim de comunicar a graça significada pelo sacramento” (CIC 1127). Novamente, o Senhor quis usar dos homens para dar continuidade à sua obra salvífica no mundo, a Igreja é somente ministra. Assim, a eficácia dos sacramentos independe da santidade do ministro que os realiza.

“O poder divino deu-nos tudo o que contribui para a vida e a piedade, fazendo-nos conhecer aquele que nos chamou por sua glória e sua virtude. Por elas, temos entrado na posse das maiores e mais preciosas promessas, a fim de tornar-vos por esse meio participantes da natureza divina, subtraindo-vos à corrupção que a concupiscência gerou no mundo” (2Pe 1, 4). Esse é o fruto da vida sacramental, nos ensina São Pedro! A remissão dos nossos pecados e a união verdadeira com o Salvador.

Através do Batismo, Eucaristia, Reconciliação, Crisma, Unção dos Enfermos, Matrimônio, e Ordem não recebemos somente a graça sacramental correspondente a cada um, mas também uma graça santificante que nos ajuda a caminhar cada vez mais firmes em direção a Deus.

Essas duas dimensões são essenciais para a compreensão de que a religião é indispensável para uma vida de fé autêntica e pautada na Verdade. Além de tudo isso, existe um detalhe ainda mais belo no que diz respeito a estar dentro da Igreja. Desde o antigo testamento, o Senhor vive realizando alianças com um Povo, e não com indivíduos isolados: “Ouve, ó Israel! O Senhor, nosso Deus, é o único Senhor. Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças” (Dt 6, 4:5); “E agora, eis o que diz o Senhor, aquele que te criou, Jacó, e te formou, Israel: “Nada temas, pois eu te resgato, eu te chamo pelo nome, és meu” (Is 43, 1).

O Povo de Israel é o Povo Eleito, a quem o Senhor se dirige em todos os momentos. Nós não fomos criados para sermos ovelhas perdidas, e sim para fazermos parte de um rebanho. Somos chamados desde já nessa vida terrena à comunhão dos santos, ou seja, a vivência unida com os filhos de Deus, seu Povo. Por isso, ser cristão fora da Igreja não é compatível com a vivência do cristianismo. A Igreja, enquanto comunidade, é uma escola de amor, uma via de santificação autêntica e bela, onde todos os irmãos buscam juntos o mesmo tesouro.

O Senhor deu o Seu Filho Único por este povo, por amor. Amar a Jesus e não amar sua Igreja é intrinsecamente impossível. “Cristo amou a Igreja e se entregou por ela” (Ef 5, 25). Ainda que muitas vezes seus membros cometam erros, Papa Pio XII é sábio em exortar: “Se alguns de seus membros estão espiritualmente enfermos, não é isso razão para diminuirmos nosso amor para com ela, mas antes para aumentarmos a nossa compaixão para com os seus membros”.

Que possamos fazer da vida na Igreja uma verdadeira ocasião de santidade e de amor fiel a Cristo. Se uma pessoa acredita que para amar a Cristo não é necessário amar sua Igreja, então, ela ainda não entendeu nada. Cabe a nós sermos os defensores do Povo Eleito do qual, louvavelmente, fazemos parte!

 

Giovana Cardoso
Discípula da Comunidade Católica Pantokrator

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