Não existe algo mais pavoroso que os nossos limites e fraquezas. Como é difícil se deparar com os limites! Limites físicos, espirituais, intelectuais… É algo que tentamos negar, esconder a todo custo.
Não é confortável tocar nos nossos limites, e fraquezas. Eu diria que é um fantasma do qual estamos constantemente fugindo.
Existe certa confusão em torno desses termos e também pouca compreensão do significado que isso tem na vida do homem. Se é difícil tocar nisso, muito mais é assumi-los para si mesmo e principalmente diante dos outros.
Por que será tão difícil lidar com os limites e fraquezas?
- Há vários motivos: achamos que ser limitado e fraco é ser mal e defeituoso, e tememos, por in segurança, não ser aceitos ou amados pelo fato de ter os limites.
Também por nossa carne cheia de concupiscência, somos tantas vezes reféns do orgulho, da arrogância e da vaidade.
Além disso, confundimos perfeição com santidade. Uma visão equivocada! Achamos que o homem que encontrou Deus, que percorre o caminho de santidade torna-se imaculado, não suscetível aos limites e fraquezas. Por isso na maioria das vezes queremos a todo custo esconder e disfarçar nossos limites e fraquezas.
- Isso me faz lembrar o Evangelho, quando Jesus diz aos discípulos: “E Jesus, tendo ouvido isso, disse-lhes: ‘Os sãos não necessitam de médico, mas, sim, os que estão doentes; eu não vim chamar os justos, mas sim, os pecadores ao arrependimento’ ”(Mc 2,17).
- De fato, reconhecer-se limitado e fraco deveria ser fonte de grande paz para o homem, pois somente quando nos assumimos fracos e limitados somos capazes de nos aproximar de Deus, como o Evangelho diz, se estou são, perfeito e acabado, não preciso do Médico dos médicos.
- O limite da condição humana
Muitas vezes não nos damos conta de que o fato de o homem ser criatura o faz um ser limitado. Só Deus é ilimitado, infinito. Todo o universo criado é finito e, portanto, limitado. Os limites são inerentes a toda a criatura e revelam a dependência que elas têm do Criador.
“Todos esperam de vós que lhes deis o seu sustento em tempo oportuno. Vós lhes dais e eles o recolhem; abris a mão, e se fartam de bens. Se escondes o rosto, eles se perturbam; se lhes retirais o sopro, expiram e voltam ao pó de onde saíram.” (Sl 104,27).
Nós nos deparamos com nossos limites em todo tempo, desde a criação do homem, ele dormir, precisa se alimentar, da ajuda de uma companheira porque sente-se só. Embora o homem seja imagem e semelhança de Deus, o limite faz parte da sua condição humana
Os limites cercam a nossa vida desde o útero materno até a morte. Eles são importantes para nós, porque nos fazem lembrar constantemente que somos criaturas, e como tal não somos autossuficientes, mas dependemos de Deus e uns dos outros.
Quanto mais nós nos reconhecemos criaturas, limitadas e fracas, mais nos achegaremos a Deus, e quanto mais junto de Deus estamos, mais fácil aceitar os limites como um bem. “Eu não seria nada, meu Deus, absolutamente nada, se não estivesses em mim” (Santo Agostinho).
Como viver com os Limites e fraquezas?
Podemos viver de duas formas.
Podemos aceitar nossa condição humana. Não somos senhores do tempo; às vezes programamos tantas coisas e determinamos que aquele dia tem que ser perfeito e nos deparamos com tantas contrariedades, com o limite do tempo, as condições climáticas por exemplo. Muitas cosas podem atrapalhar nossos planos! Vou viver isso no louvor, aceitado as contrariedades, sabendo que não sou perfeita e que muitas vezes não vou dar conta de tudo, oferecendo a Deus o meu desejo de fazer tudo o mais certo possível. Confiando em Deus, na Sua providência, que Ele rege e conduz toda a nossa vida.
Ou vou viver isso na murmuração, no peso, na irritação, porque o tempo não é suficiente, contrariado por não conseguir, frustrado, triste, na murmuração.
Tenho um temperamento muito acelerado; por muitas vezes me escondia na rapidez, na capacidade de fazer muitas coisas ao mesmo tempo. Tudo na minha vida era rápido e ordenado no tempo, mesmo as coisas mais simples da vida.
Posso contar nos dedos as vezes em que me atrasei para algum compromisso. Meus amigos sempre diziam: “quando você tiver filhos, você vai se atrasar!” Bem, tive filhos (três) e continuo não me atrasando, mas o tempo passou eu estou mais velha. Com isso, ficou evidente o limite físico, a falta de pique. Eu me canso com muito mais facilidade do que antes.
Isso começou a me fazer sofrer; e comecei a não aceitar a minha condição humana. Eu me canso. Enfim, algo que parecia impossível, como eu parar algo ou desmarcar um encontro porque estou cansada e não vou dar conta da demanda, passou a acontecer e isso começou a me entristecer.
Percebi que, mesmo inconscientemente ou sem perceber, algo que parecia ser natural do meu temperamento se tornou autossuficiência, desejo de perfeição.
Tenho aprendido a viver no louvor, na oferta e na simplicidade. Hoje eu não consegui dar conta de uma tarefa, mas estou apendendo a viver em paz com isso. É tão libertador quando nos apresentamos diante de Jesus, como Santa Teresinha nos ensina, de “mãos vazias”.
Percebi que sempre impus sobre meu corpo, sobre minha vida uma carga muito além do necessário, que só me esgotava e me fazia ser como Marta, agitada e correndo de um lado para outro sem necessidade.
Para que possamos viver plenamente nossa humanidade, precisamos reconhecer e ordenar para Deus os nossos limites, para que aonde o limite chega, Ele possa vir nos alcançar.
Um grande mal de não aceitarmos os nossos limites é que também não aceitamos os limites dos outros. Para mim, era extremamente exigente trabalhar com alguém que não alcançava o meu ritmo, o meu tempo, a minha exigência. Tantas vezes isso foi ocasião de tristeza e magoas com os outros…
Precisamos ser humildes diante de Deus que nos acolhe porque é nosso criador e só Ele é ilimitado e diante dos outros precisamos ser tolerantes. Porque, assim como eu, o outro também é limitado e fraco.
Fraco e pecador
A fraqueza humana é consequência do pecado original. Surgiu com ele e dele é consequência; não é castigo de Deus ao homem. Antes do pecado, o homem tinha, pelo dom da integridade, pleno autodomínio, não estava sujeito às paixões da carne porque seus limites e necessidades estavam sob o domínio da razão iluminada pelo dom da ciência. A partir do pecado original, o homem se sujeita à sua carne, passa a ser dominado por suas paixões e, assim, passa a ter fraquezas.
Mas precisamos entender que a fraqueza em si não é má; ela pode de ser um meio para recorrermos a Deus para lutarmos contra as tentações, o pecado está em ceder à tentação, às paixões. Muitas vezes, cedemos às nossas fraquezas e paixões, preferindo a nós mesmos a Deus.
Precisamos aceitar nossas fraquezas, mas não podemos justificá-las. Tantas vezes nos escondemos atrás da frase “sou humano”. Precisamos aceitar, mas lutar contra nossas paixões e não nos acomodar nessa justificativa. Quando conhecemos nossas fraquezas, fica muito mais fácil lutar contra elas, buscar as virtudes necessárias para vencê-las.
Se você sabe que é impaciente e irritado, que explode facilmente, fica muito mais fácil buscar constantemente a virtude da paciência.
Mas precisamos saber que o único modo de aceitar as próprias fraquezas é fazer constantemente a experiência da misericórdia de Deus, pois é onde sabemos que somos amados em nossas verdades, como um pai amoroso que sempre se volta a perdoar o filho.
Mesmo pecando, Deus continua a nos acolher e nos amar, sempre nos convidando a recomeçar, não importa quantas vezes caímos. Experimentar a misericórdia de Deus nos encoraja a não pecar mais, pois o amor misericordioso nos impulsiona: “Vai e não peques mais” (Jo 8,11).
Quando fazemos a experiência da misericórdia de Deus por nós e do Seu perdão, somos impulsionados a ter misericórdia com o outro e a ter paciência com os limites e fraquezas daqueles que estão a nossa volta.
Aprender a lidar com os limotes e fraquezas nos enche da graça de Deus, dos dons e virtudes necessárias para viver a visa cristã; isso nos agiganta na busca da santidade. Embora não pareça, os limites são nossos aliados na busca da santidade.
Quanto mais perto de Deus estamos, mais reconhecemos Sua misericórdia, e mais percebemos nossos limites; e nos lançamos em Seus braços porque Ele É nossa força.
Ele nos levanta quando caímos e nos impulsiona para a santidade.
Não tenha medo de seus limites e fraquezas, não os recalque dentro de você, mas exponha diante d’Aquele que é o único necessário e pode transformar seus limites e fraquezas em ferramentas para santidade.
“Como nos faz bem voltar para Ele, quando nos perdemos! Insisto uma vez mais: Deus nunca Se cansa de perdoar, somos nós que nos cansamos de pedir a sua misericórdia” (Papa Francisco).
Jaqueline Moreira
Consagrada da Comunidade Católica Pantokrator
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