Como é interessante e, em alguns momentos, frustrante perceber como são nossas relações de amizade. Existem amigo(s) que não sabemos como e quando chegaram, mas podemos afirmar que são nossos amigos. Existem alguns que forças maiores, como a distância, nos separaram e nem sabemos por onde andam.
Algumas amizades nem mesmo o tempo é capaz de apagar. Com esses amigos, quando nos encontramos, temos a sensação de que nunca ficamos sem nos falar por muito tempo, a conversa simplesmente acontece. Tivemos amigos que nos pareciam tão familiares, próximos, mas que “do nada” deixaram de estar conosco; esses, talvez, nunca o foram de verdade.
Decepção é uma palavra que marca a relação humana, afinal, somos todos fracos, com expectativas que nem sempre serão correspondidas. Aceitar essa realidade nos custa, contudo, é algo extremamente necessário para vivermos a amizade e qualquer outra relação com base na verdade, pois a verdade nos faz encarar tudo com liberdade (cf. João 8,32).
Algo muito importante também a ser considerado é que a amizade é dom de Deus, algo precioso, prometido àqueles que temem ao Senhor (cf. Eclesiástico 6,1-17). Sendo assim, nós não podemos “fabricar” amizades; elas acontecem, são cultivadas, sempre como dom.
Pensando em tudo isso, conversando com Deus a respeito, por providência santíssima, me deparei com o evangelho segundo São João 15. Neste trecho, Jesus diz aos seus onze apóstolos reunidos no Cenáculo, àqueles que Lhe eram mais íntimos: “Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz seu senhor. Mas chamei-vos amigos, pois vos dei a conhecer tudo quanto ouvi de meu Pai. Não fostes vós que me escolhestes, mas eu vos escolhi e vos constituí para que vades e produzais fruto, e o vosso fruto permaneça. Eu assim vos constituí, a fim de que tudo quanto pedirdes ao Pai em meu nome, ele vos conceda” (João 15,15-16).
Ao ler essas palavras, compreendi o quanto meu coração tem sede da amizade divina. Objetivamente falando, tenho sede de corresponder à amizade que Cristo já tem para comigo. Ele me escolheu como Seu amigo para revelar a mim os segredos do coração do Pai, para que em minha vida eu produza o fruto de Seu Santo Espírito (cf. Gálatas 5,22-23).
Cristo me escolheu!
Cristo me escolheu como Seu amigo para me fazer feliz! A relação de amizade com Jesus sacia as necessidades mais profundas que trazemos em nosso interior. Abrir mão dessa amizade é querer viver como a samaritana antes de se encontrar com o Senhor: insatisfeita em suas relações, na busca de alguém que a pudesse saciar (João 4,3-29). Nenhum amigo, por melhor que seja, pode nos dar a água que Cristo tem para nós, Seu Espírito!
Desejar saciar-se em alguém é como buscar água em um poço que não retêm água (cf. Jeremias 2,13), só nos cansamos e nunca nos damos por satisfeitos.
Contudo, quando acolhemos o dom da amizade divina como a verdadeira e maior amizade, quando Cristo é para nós o melhor amigo, acima do melhor amigo que podemos ter nessa terra, damos aos nossos corações o que mais queremos e precisamos: o Amor de Deus que nunca nos abandona (cf. Isaías 49,15-16).
Oração: encontro com o melhor amigo
Amizade exige relacionamento, pois é ele que torna um amigo íntimo ao outro. A constante convivência fortalece a relação, estreita os vínculos, revela o que o outro gosta, quais são suas preferências e, num relacionamento meramente humano, expõe os limites, as misérias, e nos faz respeitar o espaço do outro.
Na relação com Cristo, o conhecimento e a aproximação se dão pela oração. Santa Teresa d’Ávila, mulher intimamente unida a Cristo, grande amiga do Senhor, nos ensina que “a oração é um trato de amizade com Deus”. Dessa forma, quanto mais escolhemos estar com Ele, na oração diária silenciosa e nos afazeres do dia a dia, mais fazemos d’Ele nosso amigo, mais correspondemos à escolha que Ele fez por cada um de nós.
A oração é uma resposta na qual dizemos: “Eu Te escolho, meu Senhor, como meu amigo, como meu melhor amigo”. Crescer nessa amizade com Jesus faz muito bem para as outras amizades que Ele nos permite viver, pois aprendemos onde está a fonte e podemos ser para nossos amigos uma extensão da fonte que é Cristo que jorra em nós. Passamos a nos dar, sem exigir que o outro dê na mesma medida, pois temos tudo o que precisamos já em nós.
Edvandro Pinto
Discípulo na Comunidade Católica Pantokrator